Em uma área historicamente dominada por homens, a segurança cibernética começa a abrir espaço, ainda que timidamente, para a atuação feminina, seja como nova carreira ou como transição profissional. No entanto, a participação das mulheres ainda é limitada e sem representatividade, o que reforça estereótipos e preconceitos que dificultam seu progresso no setor.

Discutir estratégias para promover uma postura mais inclusiva e combater esses preconceitos é essencial.

Minha trajetória na tecnologia

Sou Sandra Viana e tenho 60 anos. Comecei a trilhar a área de TI em 1998, como autodidata, montando, configurando e fazendo manutenção em computadores. Em 2006, finalmente consegui fazer um curso de Redes de Computadores, área que,  na época, também era dominada por homens. Lembro que, muitas vezes, ao oferecer meus serviços de manutenção, recebia olhares desconfiados dos clientes por ser mulher e era alvo de  questionamentos sobre meus conhecimentos.

Após tantos anos na área de suporte e manutenção, resolvi, em 2015, migrar para a área de segurança da informação. Desde então, fiz muitos cursos e participei de várias lives e cursos livres até os dias atuais.

Panorama da Segurança Cibernética

Na era digital, o papel da segurança tornou-se essencial tanto para a sociedade quanto para as empresas, visando à proteção de seus ativos digitais e dados sensíveis.

Há uma carência muito grande de profissionais qualificades na área e, infelizmente, a participação das mulheres no setor é muito pequena. De acordo com um estudo elaborado pelo (ISC)2, a representação das mulheres no setor é de apenas 25% globalmente.

Os desafios das mulheres na área de Segurança Cibernética

No decorrer da minha trajetória, pude observar que participação feminina em comunidades da área de segurança é mínima, seja em CTFs (capture the flag, como Hackthebox), lives, programas de bug bount ou servidores.

Há uma presença massiva de homens, a maioria jovens, estudantes que já atuam na área e, surpreendentemente, ao longo dos anos,  nunca vi uma mulher ativa nessas comunidades. Elas existem, mas permanecem ocultas. Infelizmente, descobri o motivo principal desse anonimato feminino: o assédio.

No primeiro server que entrei, fiz uma pergunta para sanar uma dúvida relevante e a resposta foi: “só podia ser mulher”. Isso foi um verdadeiro banho de água fria, causando constrangimento geral na sala e levando o autor do comentário a se retratar, mas apenas em privado. No entanto, o estrago já estava feito; fiquei constrangida  e acabei saindo do server.

Enfrentei também outros episódios de assédio, comentários sexistas, ofensas verbais e questionamentos sobre minhas habilidades, o que me afastou temporariamente. Depois de muita reflexão, decidi retornar, mas de forma discreta, evitando participar de bate-papos ou troca de ideias.

Esse é apenas um recorte da realidade enfrentada pelas mulheres em áreas de grande predominância masculina, uma realidade cruel em pleno século XXI, mas infelizmente verdadeira.

Como superar essas barreiras

Muitas empresas têm se empenhado na contratação de mulheres e no combate ao assédio e ao sexismo, mas ainda estamos dando os primeiros passos. Acredito que é necessário mais empenho, fiscalização, treinamentos, palestras e produção de conteúdos nas redes sociais para mitigar essas práticas no ambiente corporativo, nas redes sociais,  na educação e na nossa sociedade como um todo.

Existem várias iniciativas crescendo, como: AjTy v IT que visa motivar, educar e construir uma comunidade de meninas e mulheres na área de TI; A WOMCY organização que busca reduzir a lacuna de conhecimento e aumentar as oportunidades para mulheres na indústria de cibersegurança na América Latina; Menina de Cybersec; e o program Security Girls Brasil, de mentoria da Microsoft para capacitar mulheres.

O blog Minuto da Segurança postou um artigo muito interessante, Especial Mulheres – 50 Associações de Mulheres de Segurança Cibernética, que vale a pena conferir.

O que podemos fazer para mudar esse cenário

Acredito que as mulheres da área, sejam atuantes ou estudantes, deveriam fortalecer e criar comunidades, servidores no Discord, promover lives e discutir temas de estudo ou interesse. Isso porque é fundamental fomentar a inclusão e o comprometimento das organizações com investimentos em educação, mentoria e políticas que promovam um ambiente acolhedor para a diversidade.

Os homens são muito ativos na internet, promovem muitas lives, criam canais, servers no Discord (rede amplamente utilizada na área de segurança), blogs, times de CTF, escrevem artigos e atuam massivamente no LinkedIn. Como ser notadas se permanecermos fechadas como uma concha?

Conclusão

É preciso dar esse passo se quisermos conquistar respeito, oportunidades e reconhecimento tanto das empresas quanto da sociedade como um todo. Precisamos mostrar que fazemos a diferença.

Precisamos de mais ousadia e confiança. Mudar paradigmas é difícil, mas esse processo de inclusão na cibersegurança é possível, desde que haja esforços de todos os segmentos da sociedade para criar um ecossistema mais equitativo e diversificado.

A transformação começa com pequenos passos. Que tal refletir sobre o papel que você pode desempenhar para promover a inclusão no setor de cibersegurança? Seja mentora, apoie iniciativas, produza conteúdos e questione os preconceitos quando perceber. A mudança está em nossas mãos, em nossas ações.

Artigo escrito por Sandra N., da Comunidade Programaria.