Entenda como fazer a gestão para que dados brutos se transformem em informações úteis e apoiem a tomada de decisão

Nos últimos anos, o uso de dados tem se tornado crucial para o sucesso das organizações. Sabemos, porém, que não basta apenas coletar e disponibilizar esses dados brutos. Para que de fato gerem valor, eles precisam ser processados e transformados em informações úteis, que poderão ser utilizadas para auxiliar a tomada de decisão. Nesse contexto, vemos a importância de um produto de dados e sua gestão. Para explicar melhor essa relação, evidenciamos a definição de Guima Ferreira sobre o que é um produto de dados:

 

 “Produto que consome e analisa dados para organizar ou gerar novos dados em forma de informações, insights e decisões que ajudam o usuário a atingir seu objetivo final.”
(Ferreira, 2020)

 

Tornando ainda mais claro, podemos trazer exemplos relacionados a varejo: um dashboard indicando a previsão de venda em cada loja, um relatório indicando a quantidade e sortimento ideal de compra de produtos, um painel indicando o melhor momento e valor para remarcação e precificação dos itens, dentre outros.

 

No mundo da tecnologia, há dois conceitos que frequentemente geram confusão: produto de dados e produto de software. Ambos desempenham papéis cruciais em nossas vidas digitais, mas suas naturezas e propósitos são distintos. Um produto de software é uma aplicação ou programa que executa tarefas, tendo como objetivo fornecer funcionalidades e soluções para problemas específicos. Já um produto de dados é mais focado na análise, apresentação e interpretação de informações, com objetivo de fornecer insights e informações relevantes para a tomada de decisão.

 

Para implementar um produto de dados na empresa, enfrentamos desafios significativos relacionados à resistência à mudança, pois muitos usuários podem se sentir desconfortáveis ou inseguros ao lidar com a interpretação dos dados. Além disso, a restrição de recursos e de infraestrutura também pode dificultar o processo, exigindo investimentos adequados para garantir o sucesso. A mensuração dos resultados pode ser complexa, requerendo a definição de indicadores de desempenho relevantes para avaliar a eficácia e o impacto do produto.

 

“85% dos projetos de big data falham”
(Gartner, 2017)

 

Agora que sabemos o que é e a importância de se desenvolver produtos de dados para uma organização, precisamos entender como fazer isso para termos sucesso.

 

 

Estratégias de gestão de produtos de dados

Partindo da definição de produto de dados, entendemos que seu propósito é ajudar as pessoas usuárias a atingirem seus objetivos. Então, para termos um produto de sucesso, precisamos focar nas necessidades da pessoa usuária.

 

Às vezes, o produto pode ser utilizado por diversas pessoas em diferentes áreas, cujas metas estão alinhadas com a estratégia da empresa. É nesse momento em que os riscos se tornam evidentes, mas é possível minimizá-los por meio da adoção de estratégias adequadas de gestão de produtos. Confira alguns pontos cruciais para isso:

  1. Objetivo do produto bem definido: não ter um objetivo claro e específico pode tornar difícil direcionar o processo de desenvolvimento e medir o sucesso, resultando em desperdício de esforços.
  2. Engajar as pessoas usuárias desde o começo: a falta de pesquisa adequada para entender as necessidades dos usuários pode resultar em um produto que não atende às expectativas.
  3. Priorização baseada em valor: priorizar, no início da concepção, as funcionalidades e os recursos do produto de dados com base no valor que eles proporcionam é importante para entregar valor ao usuário em pouco tempo.
  4. Mensuração de resultados: métricas que mostrem os resultados do produto são fundamentais para acompanhar seu sucesso, além de orientar evoluções que podem aprimorar a tomada de decisão.

 

Todos esses pontos precisam ser definidos e alinhados durante a concepção inicial do produto. Nesse sentido, podemos utilizar algumas ferramentas que ajudam a assegurar que esses requisitos serão atendidos de maneira efetiva, como veremos a seguir.

 

Concepção de produtos de dados

Para garantir os dois primeiros itens (objetivo e engajamento), podemos utilizar uma ferramenta do Design Thinking¹ chamada Duplo Diamante. Essa abordagem auxilia as equipes a explorarem de maneira mais profunda e criativa os desafios e a encontrarem soluções mais eficazes, tudo isso de forma estruturada e orientada a resultados.

¹Design Thinking: metodologia usada para a criação de novos produtos, serviços, processos ou para resolução de problemas, que se baseia em colocar as necessidades e perspectivas das pessoas usuárias no centro do processo, estimulando a empatia e a compreensão profunda de seus desafios e aspirações.

A Figura 1 mostra as etapas do Duplo Diamante:


Figura 1 – Etapas do Duplo Diamante

O Duplo Diamante divide o processo de concepção de um produto em quatro etapas distintas:

  1. Descobrir: é aqui que devemos entender sobre as necessidades e dores de quem sofre com o problema. É uma etapa simples, que não requer uso de técnicas complexas para encontrar e entender problemas. Para mergulhar no assunto, é interessante conversar com as pessoas usuárias, questionar os motivos de cada impasse e coletar dados sobre eles para entender suas causas e consequências.
  2. Definir: depois de coletar as diversas dores, é preciso definir quais serão sanadas. É importante focar no mínimo possível de dores, pois uma solução pensada para resolver todos os impasses pode ser inviável. Durante essa fase, a equipe converge suas ideias para estabelecer uma direção clara para o trabalho futuro.
  3. Desenvolver: tendo as dores que serão resolvidas definidas, o próximo passo é esquematizar todas as possíveis soluções. O objetivo é gerar o maior número possível de ideias criativas e inovadoras. Diversas técnicas são utilizadas, como mapas mentais e prototipagem rápida. Nessa fase, o foco é a quantidade de ideias em vez da qualidade, e todas as sugestões são bem-vindas.
  4. Entregar: na etapa final, a equipe converge novamente para selecionar as melhores soluções entre as geradas na fase anterior. Essa escolha é baseada em critérios como viabilidade técnica, adequação às necessidades dos usuários e viabilidade de implementação. Fazer testes reais da solução é um passo muito importante nesse momento. E, com a validação da ideia, é hora de refinar para deixá-la pronta para ser produzida de verdade.

 

Ao concluir essas etapas, teremos adquirido uma compreensão das necessidades das pessoas usuárias e das soluções que integrarão nosso produto, sempre priorizando e engajando as pessoas usuárias desde o início do processo. Apesar de ser uma abordagem poderosa e flexível na gestão de produtos, é muito importante ressaltar que o Duplo Diamante não é uma “receita de bolo” universal. Ele pode e deve ser moldado conforme o contexto de cada produto e equipe, variando em duração e ênfase conforme as necessidades, desafios e objetivos específicos do projeto.

Com isso em vista, abordaremos um case real de como realizamos a concepção de um produto e como fazemos a adaptação das ferramentas da literatura ao nosso contexto específico.

 

 

Desafios de produto de dados, na prática

É natural que ao se passar para a prática, surjam desafios que exijam habilidades, conhecimentos e adaptabilidade para alcançar o sucesso. Vamos analisar esses desafios de forma detalhada e examinar as melhores práticas para superá-los, fortalecendo a eficiência e eficácia na gestão de produtos de dados.

Seguindo a ferramenta Duplo Diamante, começamos com diversas entrevistas com as pessoas usuárias para entender com mais detalhes como é o processo delas, suas necessidades e o que acreditam que sejam oportunidades de valor. Para auxiliar no registro dessas informações, usamos um modelo de dores e oportunidades na ferramenta Miro, como mostrado na Figura 2.

Figura 2 – Coleta de dores, oportunidades e resultados (etapa 1)

 

Mapeamos diversas dores e oportunidade com essas conversas, porém sabemos que seria inviável sanar todas de uma vez. Assim, passamos para a segunda etapa do Duplo Diamante e definimos, em conjunto com o time e com as pessoas usuárias, quais delas são mais importantes para atacar primeiro. Podemos usar um modelo de matriz de valor de negócio versus complexidade e esforço, como mostrado na Figura 3. As oportunidades que ficarem na zona verde (maior o valor de negócio e menor a complexidade) são as mais interessantes de serem levadas adiante. Vale ressaltar que nesta etapa, é muito importante ter a participação do time técnico, pois, com essa ajuda, conseguimos eliminar algumas oportunidades que não são do nosso escopo ou que não façam sentido em um primeiro momento.

Figura 3 – Priorização de dores e oportunidade (etapa 2)
fonte: https://blog.plataformatec.com.br/2017/01/requisitos-em-equipes-ageis-falando-sobre-complexidade-e-incerteza/

 

Além dessas dinâmicas, para concluir o primeiro diamante sem causar impacto no desenvolvimento do produto no futuro, usamos também algumas dinâmicas para levantar e refinar regras de negócio, para um melhor detalhamento das oportunidades e clareza nas possíveis soluções.

Com isso, iniciamos o segundo diamante, referente às etapas 3 e 4 (desenvolver e entregar). Mapeamos, em conjunto com o time, quais são as soluções que podem ser desenvolvidas para sanar as dores priorizadas. É importante ressaltar que, no contexto de produtos de dados, não temos certeza de que uma solução funcionará de fato. No fundo, essas soluções são possíveis hipóteses que precisamos desenvolver na etapa 3 e validar na etapa 4.

Essa fase inicial chamamos de PoC (Prova de Conceito), em que criamos uma versão básica para comprovar que a abordagem proposta é tecnicamente viável e atende aos objetivos do produto de dados sem causar grandes danos. Com isso, encerramos a etapa 4 do Duplo Diamante.

O resultado da PoC pode ser ou não a validação da hipótese proposta. Sendo com um resultado positivo, concluímos que essa solução pode entrar na esteira de desenvolvimento de um MVP² (mínimo produto viável), dando escalabilidade e trazendo devolutivas para evoluções do produto no futuro.

²MVP: é uma versão inicial e simplificada do produto que contém apenas as funcionalidades essenciais para atender às necessidades básicas das pessoas usuárias e validar a proposta de valor do produto.

Quando a solução não atinge o resultado esperado, a hipótese é descartada. Por isso, é muito importante que as etapas iniciais do Duplo Diamante sigam com o maior número de detalhes possível, pois irá reduzir os riscos de levantar e testar hipóteses que não gerem valor.

 

 

Conclusão

A gestão de produtos de dados tem se mostrado fundamental para o sucesso das organizações, proporcionando insights valiosos para a tomada de decisões estratégicas. Por meio da definição de um objetivo claro para o produto de dados e do engajamento das pessoas usuárias desde o início do processo, é possível maximizar seu valor e eficácia.

A utilização do Duplo Diamante auxilia na concepção de produtos de dados de forma estruturada e orientada a resultados, identificando dores e oportunidades prioritárias. A realização de uma PoC permite validar a viabilidade técnica e de negócio da hipótese, e em caso de se obter resultados positivos, as soluções podem ser levadas adiante para o desenvolvimento de um MVP.

Para reduzir riscos e desafios é crucial utilizar estratégias adequadas de gestão de produtos de dados, garantindo que o produto atenda às necessidades das pessoas usuárias e forneça valor significativo. Ao incorporar abordagens inovadoras e voltadas para a pessoa usuária à gestão de produto de dados, as empresas podem aproveitar todo o potencial dos dados e colher inúmeras vantagens.

 

 

Para saber mais / Referências:

  1. Data Product vs Tech Product. Disponível em: https://www.linkedin.com/pulse/data-product-vs-tech-guima-ferreira/?originalSubdomain=pt
  2. Design Thinking: o que é, como aplicar e passo a passo. Disponível em: https://fia.com.br/blog/design-thinking/
  3. Curso de Product Management. Disponível em: https://www.cursospm3.com.br/curso-product-manager/
  4. Concepção de Produto Digital: por que a SoftDesign? Disponível em: https://softdesign.com.br/blog/concepcao-de-produto-digital-por-que-a-softdesign/
  5. O que é um produto de dados? Disponível em: https://www.cursospm3.com.br/blog/o-que-e-um-produto-de-dados/?gclid=EAIaIQobChMIytLYo9qggAMVB0FIAB13yQp3EAAYASAAEgJ1JfD_BwE
  6. Product Analytics: construindo uma estratégia de produto baseada em dados. Disponível em: https://www.cursospm3.com.br/blog/product-analytics-construindo-a-estrategia-de-produto-com-dados/?gclid=EAIaIQobChMIyvirv9qggAMVCTyRCh08owy7EAAYAyAAEgIsvvD_BwE
  7. Produtos de dados: o que são e quais suas características? Disponível em: https://www.aquare.la/produtos-de-dados-o-que-sao-e-quais-suas-caracteristicas/

CRÉDITOS

Autoras

Ana Carolina Quaresma, Product Owner nas Lojas Renner SA

Atua com Gestão de Produtos há 4 anos. Possui graduação e mestrado em Engenharia Química pela UFRJ, encontrou sua verdadeira paixão na interseção entre a tecnologia e a gestão de produtos. Acredita que a contribuição das mulheres em Dados é de extrema importância para a construção de um futuro mais inclusivo e equitativo. Saiba mais no LinkedIn

Suellen Barros, Analista de Negócios de Dados na Lojas Renner SA,

Formada em Análise e Desenvolvimento de Sistemas e se especializando em Gestão de Produtos de Dados, atua como Product Owner há um ano e meio, levantando requisitos e priorizando demandas com foco em entrega de valor. Busca motivar mulheres para ingressarem na área de tecnologia e reforçar a importância das mulheres nesse meio.

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Revisora

Luciana Fleury, jornalista

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Este conteúdo faz parte da PrograMaria Sprint Dados: ampliando as fronteiras.